Cosmos | Por Carl Sagan

Astronauta critica revés do programa espacial

Marcos Pontes não se sente culpado pela suspensão da contribuição brasileira à estação internacional e pede mais empenho do governo

Rodrigo Craveiro
Da equipe do Correio Braziliense

Se o programa espacial viveu em 30 de março do ano passado o seu auge, com o envio do primeiro brasileiro ao espaço, a situação atual é desanimadora. O Brasil não cumpriu o compromisso firmado em 1997 com a Nasa — agência espacial norte-americana —, deixou de enviar peças para a construção da Estação Espacial Internacional (ISS) e teve sua participação no projeto congelada. Em entrevista ao Correio, por telefone, o astronauta Marcos César Pontes não escondeu sua decepção e afirmou não se sentir culpado pelo retrocesso. “Há 9 anos brigo pela manutenção da parte da ISS para termos outros astronautas treinados”, desabafou. “Só que eu não assino nada, não faço parte da administração, apenas cuido da parte operacional e presto assessoria técnica”, acrescentou. “Um dia a gente vai ter outro astronauta, se Deus quiser.”

Apesar de o orçamento do programa espacial ter aumentado de R$ 98,3 milhões em 2003 para R$ 258 milhões em 2006 — uma evolução de 160% —, a contribuição brasileira com o projeto da Nasa caiu de R$ 17 milhões em 2000 para uma média de R$ 7 milhões.

O especialista John Logsdon, diretor do Instituto de Políticas Espaciais da Universidade George Washington e conselheiro da Nasa, reconheceu ontem a gravidade da situação.

Já é tarde demais para o Brasil fazer qualquer coisa, a não ser tornar-se um usuário da estação”, admitiu. De acordo com ele, a decisão do Brasil de pagar por um vôo espacial na Soyuz, ao invés de financiar os projetos da ISS, causou uma má impressão na Nasa.

Marcos Pontes se defendeu das críticas e afirmou que a missão Centenário foi importante para a Nasa. “A agência norte-americana tem dificuldade em colocar astronautas estrangeiros em ônibus espaciais. A Nasa espera que outros países cheguem ao espaço sem que dependam dela”, argumentou. O astronauta lembrou que a participação na ISS, por meio da construção de peças pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), praticamente nada custaria ao Brasil. E arrematou: “A AEB tem todos os recursos necessários para essa contribuição”.

Cooperação

Procurado pela reportagem, Sérgio Gaudenzi, presidente da AEB, não quis se pronunciar sobre o assunto. A agência se limitou a divulgar uma nota em que anunciava negociações envolvendo o Itamaraty, a Nasa e o Departamento de Estado dos EUA “para uma nova etapa no relacionamento de cooperação entre Brasil e Estados Unidos”. Ainda segundo a nota, o interesse da AEB é de uma cooperação bem maior que a firmada no projeto da ISS. “Brasil e EUA têm se aproximado mais e os termos de um novo acordo podem ser mais amplos”, acrescenta.

De acordo com Pontes, não houve suspensão do programa espacial brasileiro, mas um congelamento técnico, com a finalidade de aguardar a conclusão das negociações. “Existe um ponto de espera para a definição sobre o que o Brasil produzirá”, explicou. O astronauta assegurou que, na teoria, o país ainda tem direito a utilizar as instalações da ISS. “O documento que regula a participação brasileira foi firmado entre nações e continua em vigência”, comentou. E lembrou que o Brasil pode contribuir com outros projetos e iniciativas, e não apenas enquanto fornecedor de peças. “Isso pode favorecer a nossa ciência e a nossa indústria.”

Consórcio científico

A construção da Estação Espacial Internacional (ISS) envolve 16 países — EUA, Rússia, Alemanha, França, Reino Unido, Japão, Canadá, Suíça, Itália, Suécia, Dinamarca, Bélgica, Brasil, Holanda, Espanha e Noruega. Composta de laboratórios científicos e módulos operacionais, ela oferece condições para uma série de experimentos de bio e nanotecnologia, combustão, materiais, medicina e produção de medicamentos.

Assinado em 1997, o acordo entre a Nasa e a Agência Espacial Brasileira (AEB) previa que o Brasil contratasse junto às indústrias nacionais a construção de partes da ISS. Em troca, o governo teria o direito de usar as instalações para realizar pesquisas, transportar experimentos e enviar tripulantes. Com a suspensão do acordo, o Brasil perde a preferência de utilizar a estação.

Comentários


Amazon Prime Video

Postagens mais visitadas