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Tecnologia brasileira na Lua

Pesquisa da Universidade Federal de Juiz de Fora contribui para o desenvolvimento de vidro especial que ajudará na criação de uma base do satélite natural da Terra

Ricardo Beghini - Correio Braziliense

Belo Horizonte — Professores do Departamento de Física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) tornaram-se parceiros na pesquisa de um simulador do solo lunar a partir de cinzas vulcânicas encontradas no Arizona (EUA). O estudo, em conjunto com a Missouri University of Science and Technology, foi encomendado pela agência espacial americana (Nasa) e resultará no desenvolvimento de uma plataforma de vidro que possibilite o pouso de espaçonaves sem que a poeira se espalhe.

As partículas suspensas nessas ocasiões podem causar problemas para as vestimentas dos astronautas e para as naves, já que o composto é altamente abrasivo. De acordo com a professora Zélia Ludwig, coordenadora do projeto na UFJF, o fenômeno ocorre devido à baixa gravidade da Lua, que é de 1,62m por segundo ao quadrado (muito inferior à da Terra, de 10m/s²). "A poeira não se dispersa", ressalta.

A parceria entre a UFJF e a Missouri University ocorreu porque a universidade norte-americana conta em seus quadros com o professor brasileiro Signo Reis, colega de Zélia no curso de pós-doutorado em novos materiais pela Universidade de São Paulo (USP).

As duas instituições têm papéis distintos no trabalho e trocam informações frequentemente durante o desenvolvimento. Enquanto a de Missouri sintetiza os materiais idênticos aos encontrados em solo lunar, a mineira faz a caracterização ótica e térmica dos vidros por meio do espectroscópio Raman, equipamento que proporciona, em poucos segundos, informação química e estrutural de um número muito grande de material composto, orgânico ou inorgânico, permitindo sua identificação com certa facilidade.

"Vamos estudar, por exemplo, a capacidade do vidro como isolante térmico", revela o professor Virgílio de Carvalho dos Anjos, que coordena o Laboratório de Espectroscopia de Materiais do Instituto de Ciências Exatas (ICE), que ficará responsável, especificamente, por descobrir as características do vidro lunar, composto por várias substâncias, entre elas fosfato, ferro, carbonato de cálcio e dióxido de silício.

A pesquisa pode ocorrer na UFJF porque os laboratórios da instituição ganharam investimentos recentemente. Desde novembro do ano passado, o Laboratório de Espectroscopia de Materiais conta com um espectroscópio. Já o Laboratório de Produção de Novos Materiais e Filmes Finos (Lapromav), por meio do projeto Estudo de Propriedades Óticas e Térmicas de Vidros Especiais — aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) —, recebeu R$ 70 mil. "A parceria com a Missouri University ocorreu no momento oportuno", destaca Zélia.

Os investimentos permitiram a compra de quatro equipamentos: um forno para altas temperaturas (até 1.600ºC), usado para testes que requerem muito calor, sintetização e outras aplicações; um forno Mufla (até 1.200ºC), indicado para os mais variados processos de aquecimento realizados em laboratórios e indústrias; uma máquina para produzir filmes finos, semelhante ao pesquisado, e a capela de exaustão, que protege o operador do contato direto com produtos químicos em análise. "O vidro sintetizado na Missouri University of Science and Technology poderá ser refundido e ter sua composição alterada, pois dispomos de fornos que têm essa capacidade", salienta a professora.

Além da pesquisa envolvendo o solo lunar, o maquinário, que será instalado até dezembro, poderá ser utilizado, futuramente, em estudos sobre fibra ótica. A expectativa é que a parceria entre a UFJF e a Missouri University seja transformada em convênio pelos reitores a partir do ano que vem, permitindo o intercâmbio de professores e alunos.

Corrida Espacial

Os pesquisadores salientam que o modo como a plataforma final, criada a partir do vidro lunar, será desenvolvida não está previso na primeira etapa do projeto, que deve ser concluído em até cinco anos. "Essa é uma questão que ainda será avaliada pela Nasa, abrindo inúmeras possibilidades de novos estudos", explica Zélia.

A necessidade de se buscar recursos energéticos em solo lunar é o que motiva a nova corrida espacial. A primeira, nas décadas de 1960 e 1970, que culminou com a chegada do homem à Lua, em 1969, foi motivada pela disputa geopolítica durante a Guerra Fria, entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética. A intenção futura, depois de seis aterrissagens bem sucedidas, é construir uma base permanente, capaz de desenvolver produtos que farão as operações lunares autossustentáveis.

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