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Especialista: programa espacial brasileiro corre o risco de parar

Juliano Pires - Jornal da Câmara

O programa aeroespacial brasileiro corre o risco de ser paralisado em breve, segundo afirmou na semana passada o diretor de Política Espacial e Investimentos Estratégicos da Agência Espacial Brasileira (AEB), Himilcon Carvalho, em audiência pública promovida pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. Segundo ele, o programa carece de falta de investimentos nas áreas de formação e capacitação em recursos humanos e de pesquisa científica e tecnológica.

Carvalho considera a situação grave. "Hoje, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) e a indústria contam com aproximadamente três mil especialistas, o que não é muito. Além disso, há o envelhecimento e a evasão do quadro de pessoal dos institutos públicos, sem a devida reposição e novas contratações. E não há formação específica para a área espacial", enumerou.

Pesquisa e ficção - Segundo Carvalho, as duas principais linhas de ação do programa aeroespacial brasileiro são, de um lado, os projetos na área de foguetes e de satélites e, de outro, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, que antes ficavam em torno de 14% do total do programa, mas caíram para 8%. "Não estamos fazendo pesquisa de ficção, mas de tecnologia crítica sem a qual o programa vai parar", alertou.

Ele acrescentou que, para a capacitação de recursos humanos, o investimento não passa de 2% do orçamento total do programa espacial. "A solução seria aumentar o orçamento, pois não há como realocar os recursos", ponderou. Ainda de acordo com o diretor, a agência seria um retrato da carência do setor, pois não tem quadro próprio: conta com apenas 90 servidores, todos ocupando cargos comissionados.

Transferência - Também segundo Carvalho, sem um investimento real em formação de talentos, o Brasil nunca vai atingir o seu principal objetivo no programa espacial, que é o de atingir autonomia tecnológica. Ele observou que os acordos internacionais são muito limitados para a transferência de tecnologia, até porque não é do interesse dos outros países transferir conhecimentos.

"Faltam tecnologias para aplicação de sensores óticos (usados no exterior para aplicações de defesa); radares de abertura sintética (para monitorar o desmatamento através das nuvens); propulsão líquida para foguetes (para entrar na área da competição comercial); e navegação de satélites", detalhou.
 
Entre outros problemas, ele citou a falta de domínio de tecnologias críticas, legislação de compras não adaptada à complexidade do setor e mercado insuficiente para estruturar a cadeia produtiva. "Cada satélite custa algo como 150 milhões de dólares; os projetos são arriscados", ressaltou.
 
Aposentadoria - O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Vale do Paraíba, Fernando Morais, disse que 327 servidores do Inpe e do DCTA estarão em condições de se aposentar em cinco anos, o que equivale a um terço do quadro de pessoal dos dois órgãos. Ele observou que a média de idade dos pesquisadores já é superior a 50 anos.

Para o deputado Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), que propôs a audiência, o programa espacial está muito aquém das necessidades e das possibilidades do País, inclusive no que se refere ao retorno econômico à sociedade. Emanuel Fernandes (PSDB-SP) atribuiu a situação ao que chamou de falta de visão de longo prazo. "Há muito tempo não temos uma política de Estado. Faltam projetos catalisadores, as tecnologias críticas são importantes e ninguém vai passá-las para nós", lamentou.

Formação de engenheiro espacial leva uma década e meia

Na audiência, o chefe de Administração do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), Maurício Brandão, informou que são necessários mais de 15 anos para formar um engenheiro espacial. Segundo ele, é fundamental criar um mecanismo para que os especialistas possam transferir o conhecimento aos novos pesquisadores antes de se aposentarem. "O ideal seria que os novos pesquisadores pudessem trabalhar com os antigos, para receber o conhecimento. Com muito custo, se autoriza que uma vaga seja substituída via concurso público e falta o mestre, que se aposentou", disse.
 
Segundo o DCTA, foi autorizado recentemente um concurso com 94 vagas para o órgão, que reúne o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), responsável pelo desenvolvimento do projeto do foguete brasileiro. "Nós podemos ir direto ao nível da Nasa, comprando tecnologia do exterior, mas escolhemos trilhar todo o caminho, gerando emprego e estimulando a indústria nacional. Por isso, fazemos ensino, pesquisa, desenvolvimento e produção", afirmou Brandão.

O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Vale do Paraíba, Fernando Morais, disse que os alunos formados pelo ITA preferem fazer concurso para a Receita Federal a trabalharem no setor aeroespacial, onde o salário inicial gira em torno de R$ 4 mil.

"Na Receita, eles já entram ganhando R$ 8 mil. E os bancos montam estandes no ITA para recrutar os recém-formados, porque conhecem o seu potencial", contou.

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